A professora Loide Ostrufka, 51 anos, estava em êxtase nas primeiras horas da manhã desta terça-feira (3), quando voltava de Brasília para Curitiba em uma caravana organizada para ver a pose do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Sindicalista, Loide acompanhou o preso do PT em 2018, fez campanha pela liberdade em 2019 e campanha para sua eleição em 2022. Não no meio da multidão, sentiu-se realizado ao vê-lo subir a rampa do Palácio voltar a fazer o Planalto depois de tantos acontecimentos.
Ainda tive essa sensação na viagem de volta, junto com sua amante, Sueli Silvia Adriano, 57, e sua amiga Juliana Mildenberg, 33. Às 7h30 daquela manhã, um telefonema mudou seu estado de espírito: um vizinho veio avisar que o apartamento de Loide e Juliana havia sido invadido e incendiado. Que os bombeiros não eram locais no momento, mais de muitos já haviam sido queimados. O carro daquele Loide não estava na garagem. E que a comemoração do professor tem que acabar.
“Estamos perto de São Paulo, sem poder fazer nada”, diz. “Aquele foi um momento muito especial para as pessoas. Mudou tudo. Foi um baque.”
Loide, Sueli e Juliana partiram para Curitiba para viagem de volta às 13h. Diretamente para o apartamento, no bairro de Abranches. Quando disparam, são orientados a não tocar em nada. O imóvel ainda passará por perícia.
O Elas vai direto ao 4º Distrito Policial de Curitiba para registrar boletim de ocorrência. A partir do que viram, eles estavam convencidos de que haviam sido vítimas de um ataque de um político — em Curitiba, pela operação Lava Jato que levou Lula à prisão (as condenações foram posteriormente anuladas), com 65% dos eleitores votando em Jair Bolsonaro (PL) não segundo turno.
“O fogo começou no meio do meu quarto”, supôs Juliana. “Use meus livros como espaço em branco. Queime as bandeiras da CUT [Central Única dos Trabalhadores], bandeiras LGBT. Mas não levaremos objetos de valor que possam ser vendidos. Que ladrão seria esse?”
Segundo Juliana, os peritos informaram, extraoficialmente, que o incêndio não foi causado no local. ano ABAa Polícia Civil do Paraná informou que “está apurando o caso e realizando diligências a fim de identificar o autor do ato criminoso, bem como apurar a motivação e apurar a dinâmica do caso”.
Em dia sombrio, o delegado Geraldo João Celezinski concedeu entrevistas à imprensa e confirmou a possibilidade de crime político ou de homofobia. Neste momento, ninguém foi acusado ou preso.
‘Queimaram os livros que movem a minha vida’
Professora de educação infantil, servidora da Prefeitura de Curitiba, Juliana está licenciada há um ano para se dedicar ao Sismuc (Sindicato Municipal dos Servidores Municipais de Curitiba), como coordenadora geral. Loide é o secretário-geral da entidade.
Eles moram juntos em uma casa que, não é verdade, corresponde a duas divisões de um imóvel comercial convertido em apartamento. Loide se mudou para ela há pouco mais de um ano, reformou o espaço e, há alguns anos, de sua cara residencial para o que parecia inóspito.
“Aquele era o nosso cantinho, sabe?”, lamenta Loide, referindo-se ao apartamento que pegou fogo. “Não era o lugar mais bonito. Não era o maior. Mais pessoas construíram nossa casa lá.”
Juliana checou depois. Mudou-se vive há cerca de dois meses com um amigo, um colega de profissão e um colega de sindicato.
Nem todos os dias da união, são naturalis você se chocar com pessoas de alinhamentos políticos divergentes, dizem. “[Mas] Nunca imaginei que alguém chegaria ao ponto de queimar minha casa por causa do meu disso”, diz Loide. Quase tudo virou cinza. “Eu queimaria livros que mudariam minha vida. É triste.”
‘Amanhã será outro dia’
Horas depois do incêndio, o caso nunca viralizou na internet. Políticos da cidade vão divulgar o fato em seus perfis. A veradora Carol Dartora (PT), primeira elite negra da Câmara de Curitiba, classificou o ocorrido como crime.
Sim, o advogado Luiz Carlos Rocha, o Rochinha, que atuou em defesa de Lula durante a Lava Jato, divulgou uma vaca virtual organizada para ajudar os professores. A vaca, cuja meta é arrecadar R$ 75 mil, já passou dos R$ 77 mil.